VETADA

 

LEI COMPLEMENTAR Nº. 067/2008

 

Altera a Lei Complementar nº 5, de 28 de dezembro de 1992, que dispõe sobre o Código Tributário do Município de Jacareí, no que se refere à inclusão do exercício da atividade de Óptico Optometrista e da prestação de serviços da Optometria.

 

O PREFEITO DO MUNICÍPIO DE JACAREÍ, USANDO DAS ATRIBUIÇÕES QUE LHE SÃO CONFERIDAS POR LEI, FAZ SABER QUE A CÂMARA MUNICIPAL APROVOU E ELE SANCIONA E PROMULGA A SEGUINTE LEI COMPLEMENTAR:

 

Art. 1º  Fica incluída no rol da lista de prestação de serviços, constante do artigo 130 da Lei Complementar nº 05, de 28 de dezembro de 1992, a seguinte atividade:

 

“Art 130  ...............................................................................

...............................................................................................

4.24.  Exercício de Óptico Optometrista e prestação de serviços de Optometria Básica e Plena;”

 

Art. 2º  Esta Lei Complementar deverá ser regulamentada pelo Chefe do Executivo Municipal no prazo de 30 dias de sua publicação, em especial no que concerne à fixação da alíquota e base de cálculo para obtenção do valor do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, previsto no Anexo nº 1, Tabela nº 1, da Lei Complementar nº 05, de 28 de dezembro de 1992.

 

Art. 3º  Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.

 

Prefeitura Municipal de Jacareí

 

MARCO AURÉLIO DE SOUZA

Prefeito Municipal

 

AUTOR: VEREADOR ITAMAR ALVES DE OLIVEIRA.

 

Este texto não substitui o original publicado e arquivado na Prefeitura Municipal de Jacareí.

 

MENSAGEM de Veto Total ao Projeto de Lei Referente ao Processo n.º 109/2008  da Câmara Municipal de Jacareí

 

(Lei COMPLEMENTAR nº. 067/2008)

 

Trata-se do projeto de autoria do Vereador ITAMAR ALVES DE OLIVEIRA, que dispõe sobre alteração da Lei Complementar n.º 5, de 28 de dezembro de 1992, que dispõe sobre o Código Tributário do Município de Jacareí, no que se refere à inclusão do exercício da atividade de Óptico Optometrista e da prestação de serviços da Optometria, aprovado em Sessão de 24 de junho de 2008, atribuindo n.º de Lei Complementar n.º 067.

 

O autor do projeto justifica a propositura com esclarecimentos sobre a optometria e o trabalho realizado pelos ópticos-optometristas, bem como os benefícios que esta ciência traz à população.

 

Em que pese a nobre iniciativa do Vereador de incluir os serviços prestados na área da optometria na lista de serviços prevista no CTM, no que tange ao ISSQN, e assim, de certa forma, reconhecer a profissão de optometrista, e através disto até mesmo ampliar as possibilidades de arrecadação do Município, existem razões que impedem a outorga da sanção, pelas razões a seguir enunciadas.

 

A proposta inclui no rol da lista de prestação de serviços, constante do artigo 130 da Lei Complementar n.º 05, de 28 de dezembro de 1992 – Código Tributário do Município de Jacareí o item 4.24. Exercício de Óptico Optometrista e prestação de serviços de Optometria Básica e Plena;

 

O artigo 130 da LC n.º 05/1992 trata da incidência do ISSQN sobre a prestação de serviços contida na lista que vai do item 1 ao 40.01. Este artigo foi objeto de alteração pela Lei Complementar n.º 50, de 11 de dezembro de 2003, resultado do projeto de lei complementar n.º 003/2003.

 

Após análise técnica e jurídica, conclui-se que a Lei Complementar n.º 067/2008 na forma apresentada é manifestamente inconstitucional e ilegal, ferindo expressamente dispositivos da Constituição Federal. Os vícios formais e materiais apresentados na propositura impedem sua sanção.

 

Tem razão o bem lançado parecer - AJ / AAF – N.º 089/2008 do Assessor Jurídico da Câmara, dr. Adão Aparecido Fróis. A competência do Município para tributar serviços de qualquer natureza (inciso III do artigo 156 da CF) encontra duas restrições, e uma delas é que o serviço a ser tributado deve ser definido em lei complementar.

 

O ISS é um imposto de competência impositiva municipal. Só que o Município não recebeu competência plena para o exercício de seu poder tributário por meio desse imposto.

 

Além das limitações genéricas, referentes aos impostos em geral (legalidade, isonomia, vedação de efeito confiscatório, capacidade contributiva, imunidade genérica etc.), o legislador constituinte de 1988 prescreveu limitações específicas.

 

Dispõe o art. 156 da CF:

 

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

...

 

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;

 

O Código Tributário Nacional – CTN, como extensão do texto constitucional, especialmente do art. 146, III, ‘a’, é matriz institucional do ISSQN. or sua vez, o Decreto-Lei n.º 406/68 traz a definição do fato gerador do ISS, em seu art. 8º, in verbis:

 

Art. 8º O imposto de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.

 

1º. Os serviços incluídos na lista ficam sujeito apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva o fornecimento de mercadorias.

 

2º. O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias.

 

O dispositivo legal acima foi revogado pela Lei Complementar nº 116/03, mas a norma nele contida foi mantida pelo novo ato legal, conforme se depreende da leitura de seu art. 1º, caput, que assim dispõe:

 

Art. 1º  O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que estes não se constituam como atividade preponderante do prestador.

(...).

 

A forma escolhida pela CF para dar unicidade ao Sistema tributário nacional – STN foi a incumbência conferida à lei complementar para definir o fato gerador, a base de cálculo e os contribuintes de todos os impostos de todas as esferas de Governo do País. Em decorrência, a instituição do ISS, pelos municípios, está submetida às disposições da Lei Complementar n.º 116, de 31/07/2003, que dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e dos Distrito Federal, e dá outras providências.

 

Os elementos básicos do ISS estatuídos na LC 116/2003 – fato gerador, base de cálculo e contribuintes, bem como as limitações de suas alíquotas e o conceito de estabelecimento – em obediência ao princípio de unicidade do STN (CF art. 146, III, ‘a’), devem figurar, ipsis literis, na legislação tributária de todos os municípios, a qual deve, ainda, subordinar-se aos princípios e mandamentos constitucionais e legais, especialmente os definidos no CTN.

 

Assim, a partir da Lei Complementar nº 116/03, o fato gerador do ISS é a prestação de serviços definidos na lista a ela anexa. Da mesma forma que na vigência do art. 8º do Decreto-Lei nº 406/68, com base na nova legislação, para que ocorra o nascimento da obrigação tributária, não basta que o fato esteja previsto em lei e tenha sido celebrado um contrato prevendo sua ocorrência mediante prestação de serviço, necessário será que ocorra a efetiva prestação de serviços. E, como resta cristalino, se o serviço prestado não estiver previsto em lei, jamais poderá sofrer a incidência do ISS.

 

Não é qualquer serviço que pode ser tributado pelo Município, mas apenas aquele incluído na lista de serviços. E a lista poderá incluir serviços de qualquer natureza, isto é, qualquer tipo de serviço pode vir a ser tributado, desde que incluído na lista. Não há como objetar a expressa limitação estabelecida pelo legislador constituinte original. Contra regra expressa da Constituição não há como contrapor-se, mediante invocação do princípio constitucional da autonomia e independência do ente político local, que permitiria a tributação de serviço de qualquer natureza, de forma ampla e ilimitada. O legislador constituinte original é livre para outorgar a quantidade de impostos a cada ente federado, bem como desenhar os limites e condições para o exercício do poder impositivo, relativamente a cada imposto que lhes é atribuído de forma privativa.

 

Dúvida não pode haver de que a lista de serviço integra a definição de fato gerador do ISS como elemento objetivo ou nuclear desse fato gerador. A definição do fato gerador está sob reserva de lei ordinária do ente político competente para instituir o tributo (art. 97, III do CTN), pelo que, cabe à lei municipal, naquelas hipóteses em que a lista nacional fizer referência aos serviços congêneres, em querendo tributar esses serviços, explicitar quais são esses serviços congêneres, sob pena de violar o princípio da legalidade tributária (art. 150, I da CF).

 

Apesar de toda a celeuma em torno da lista de serviços de incidência do ISS, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se a favor da taxatividade da lista, mitigada, posteriormente, pelo entendimento de que a sua taxatividade não exclui a interpretação de que cada um de seus itens alcance maior ou menor compreensão, atingindo serviços que, se não individualizados, devam considerar-se abrangidos:

 

Esta é taxativa, "embora cada item da relação comporte interpretação ampla e analógica." (grifo nosso) (STF, RE nº 75.952-SP, Ac. De 25.10.73. 2º Turma, relator Ministro Thoompson Flores, RTJ 68/198). Na mesma linha de pensamento RESP 6.705, Rel. Min. Vicente Cermicchiaro, julgado em 12.12.90.

 

A questão da taxatividade da lista de serviços contidos na lei federal já está resolvida há mais de duas décadas, conforme ensina o jurista Bernardo Ribeiro de Moraes[1], ao afirmar que:

 

Não podemos deixar de conceber a lista de serviços baixada por lei complementar como taxativa... Assim se manifesta a doutrina especializada, a começar por Aliomar Baleeiro, (in Direito Tributário Brasileiro, 7ª ed., Forense, pág. 264, “a lista ... é taxativa: tributáveis serão só os serviços nela mencionados, embora cada item dessa lista comporte interpretação ampla e analógica).

 

O mesmo autor acima citado por Bernardo Ribeiro de Moraes, Aliomar Baleeiro dispõe em sua obra:

 

Uma longa discussão se instalou no País, para ser saber a natureza da lista, se numerus clausus ou apertus. Prevaleceu, na jurisprudência de nossos tribunais superiores, a posição restritiva à autonomia municipal, que qualificou a lista de serviços de taxativa, abrigando os únicos e específicos serviços tributáveis pelo ISS. Mesmo após o advento da Constituição de 1988, a maior parte da doutrina e a jurisprudência dos tribunais superiores posicionaram-se em favor da taxatividade da lista de serviços. /.../ jurisprudência recente do STF tem confirmado esse mesmo entendimento da taxatividade da lista de serviços e da incidência do ICMS sobre as operações de circulação de mercadorias, ainda que acompanhadas de prestações de serviços, não relacionados naquela lista . É o que se constata no RE-144.795-8 1ª T., Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 19.10.93.

 

E foi por esta razão que o CTM (LC n.º 05/1992) sofreu alterações em dezembro de 2003, para que a lei municipal se adequasse à LC n.º 116/2003. Na ocasião da apresentação do PLC n.º 003/2003 contou na justificativa:

 

No que se refere à primeira categoria de alterações, as que visam adequar a legislação tributária municipal à Lei Complementar Federal n.º 116, de 31 de julho de 2003, cabe lembrar que o Governo Federal, através do referido instrumento jurídico, veio a alterar substancialmente a forma de cobrança do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN, explicitando situações que até então caminhavam na penumbra da incerteza jurídica e ampliando o horizonte tributável, introduzindo novas possibilidades de incidência, anteriormente tributadas por interpretação extensiva.

Sob esse aspecto, a nova legislação federal, que exige do Município a competente adequação, a fim de não prejudicar a arrecadação prevista para os exercícios posteriores, sob pena de caracterizar renúncia de receita, posto que a legislação atualmente aplicável veio a ser tacitamente revogada por força dos princípios que regem a hierarquia legislativa, acabou por conceder aos Municípios novos instrumentos e novas possibilidades, dificultando a sonegação e a evasão de receita.

Assim, grande parte dos dispositivos constantes o presente Projeto de Lei Complementar consistem da simples transposição dos dispositivos constantes da Lei Complementar Federal n.º 116/03 para o ordenamento municipal.

 

Vale ressaltar que sob esse ponto de vista, a legislação tributária municipal passará a caminhar em perfeita sintonia com o ordenamento federal que rege a matéria, inclusive no que tange à nova lista de atividades, que inclusive acompanha a federal até mesmo nos vetos, mantidos por questão de ordem técnica, como bem poderá observar o legislador municipal.

                                                       

Cabe mencionar que a circunstância da lista da LC 116/2003, a exemplo da LC 56/1987, comportar interpretação ampla e analógica, não implica em sua ampliação, mas, tão somente, a inclusão de congêneres (pertencente ao mesmo gênero); congenérico. Idêntico, semelhante, similar, segundo o Aurélio) em algumas atividades. Por oportuno, vale transcrever a ementa do julgamento pela Segunda Turma do STJ, do Recurso Especial (RESP. 0001837/89) prolatada em 15/08/90 e publicada no DJ de 10/09/90, pág. 9116:

 

A lista da legislação municipal dos serviços tributáveis deve ater-se ao rol da legislação nacional, a teor da Constituição da república de 1969. Imperativo do princípio que impõe o numerus clausus. Admissível a interpretação extensiva e analógica. Aquelas respeitam os marcos normativos. A última acrescenta fatos novos.

 

Como se pode observar, na lista de serviços anexa à LC n.º 116/2003 não prevê o serviço de óptico optometrista, e da mesma forma não pode o CTM conter este item, pois o ISS somente pode incidir sobre os serviços previstos no rol taxativo da Lei Complementar Federal.

 

Portanto, não pode uma lei municipal ampliar a lista de serviços prevista na LC n.º 116/2003, como na forma pretendida no projeto de lei aprovado pela Casa Legislativa.

 

A proposta também se mostra inconstitucional e ilegal diante da violação do princípio da separação entre os Poderes (artigo 2º da Constituição Federal), que visa garantir a harmonia e independência entre o Executivo, Legislativo e Judiciário.

 

A iniciativa legislativa é faculdade atribuída para apresentar projeto de lei ao Poder Legislativo, conferida de forma concorrente a mais de uma pessoa ou órgão, mas, em casos expressos é atribuída com exclusividade a apenas um deles.

 

Projetos de lei que disponham sobre matéria tributária são de iniciativa exclusiva do Chefe deste Poder, nos exatos termos do artigo 61, § 1º, inciso II, alínea “b” da Constituição Federal, aplicável aos Municípios pelo princípio da simetria do centro.

 

De acordo com o teor do projeto de lei apresentado pela Casa Legislativa, a inclusão do item 4.24 na lista de serviços contida no artigo 130 do CTM gera a obrigação de tributar o serviço descrito. Nestes termos, com a aprovação desta Lei de iniciativa do Poder Legislativo foi violado o princípio da separação entre os Poderes.

 

Dentro das competências da Câmara Municipal (artigos 27 e 28 da LOM) não está inserida competência para legislar sobre matéria tributária.

 

Ademais, caso fosse possível considerar viável a proposta legislatória, a falta de inclusão do item 4.24 na Tabela n.º 1 do Anexo n.º 1 do CTM, a fim de definir a alíquota do ISS para este serviço resulta em inaplicabilidade desta Lei Complementar n.º 067/2008.

 

O artigo 2º da referida Lei ainda dispõe que o Executivo deve regulamentá-la no prazo de trinta dias, em especial quanto à fixação da alíquota. Contudo, para esta regulamentação obrigatoriamente o Executivo teria de enviar projeto de lei complementar para alterar a citada Tabela, ou seja, seria necessária a edição de uma nova lei complementar para aplicar a LC n.º 067/2008. 

 

Cumpre notar, que a iniciativa de leis do Executivo insere-se no campo de competência privativa do Prefeito, consoante o inciso I, do artigo 61, da Lei Orgânica do Município, não podendo a Câmara impor o seu exercício.

 

CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, face aos problemas detectados, somos compelidos a vetar totalmente a Lei Complementar n.º 067/2008, porquanto:

 

a) fere expressamente dispositivos da Constituição Federal, quanto à competência legislativa para disciplinar a matéria acerca da lista de serviços passíveis de incidência do ISSQN;

 

b) fere expressamente o princípio constitucional da separação entre os Poderes estabelecido no artigo 2º da CF;

 

c) contraria o princípio da legalidade que deve revestir os atos administrativos.

 

Gabinete do Prefeito, 16 de julho de 2008.

 

MARCO AURÉLIO DE SOUZA
Prefeito do Município de Jacareí

Este texto não substitui o original publicado e arquivado na Prefeitura Municipal de Jacareí.



[1] Doutrina e Prática do ISS, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, pg. 108.