Art. 1º Fica instituída a obrigatoriedade de constar em todos os impressos da Administração Pública Municipal, da Câmara Municipal, incluídas as Autarquias e Fundações, a inscrição “Deus Seja Louvado”.
Art. 2º A inscrição “Deus Seja Louvado” deverá ser impressa à margem esquerda do papel, embaixo do brasão do Município.
Art. 3º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário.
Jacareí, 29 de março de 1989.
Senhor Presidente,
Incluso encaminhamos a Vossa Excelência as razões do VETO
TOTAL ao projeto de lei de autoria do nobre Vereador Helcias
Nogueira Paranaguá (“lei nº
No ensejo apresentamos os protestos de consideração e apreço.
Senhor Presidente,
Cumprindo disposições legais, tenho a honra de levar ao conhecimento de Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do artigo 30 da Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São Paulo (Decreto-Lei Complementar Estadual nº 09 de 31 de dezembro de 1969), sou compelido a VETAR TOTALMENTE o Projeto de Lei de autoria do Nobre Vereador HELCIAS NOGUEIRA PARANAGUÁ (processo nº 005, de 03.02.89), aprovado por essa Egrégia Casa Legislativa, ao qual foi atribuído o número de lei 2.586, conforme oficio nº 046/89-CMP, pelos motivos seguintes.
Embora reconhecendo o intuito do nobre Edil, não podemos concordar com sua pretensão, quando deseja impor, através de lei, um comportamento nitidamente religioso.
Dispõe a vigente Constituição da República Federativa do Brasil, por seu artigo 59, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, sendo inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias (inciso VI).
Nota-se, por estas disposições constitucionais, ter sido suprema vontade estabelecer, antes de tudo, um direito individual de qualquer cidadão a ver respeitada sua liberdade de crença, ou não, e bem assim de ver assegurada o exercício do ofício religioso, protegido os locais de sua cultuação.
Tanto assim é que a própria Constituição Federal assegura, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva havendo, neste caso, na conformidade das normas complementares que venham a ser editadas, um dever do ministério religioso. Não será, contudo, o caso da Administração Municipal.
Dentre os princípios que direcionam a Administração Pública estão os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, não estando incluído o da religiosidade. Este é assegurado, como já esclarecido, individualmente, para mútuo respeito.
Até mesmo a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos somente poderão ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, não exigindo o § do art. 37 da Constituição Federal, o caráter religioso.
De conformidade com a Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São Paulo, o Governo Municipal é exercido pela Câmara de Vereadores e pelo Prefeito, competindo ao Município prover a tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse e ao bem-estar de sua população. Entretanto, as funções de governar não se confundem com as de administrar. A própria Constituição Estadual nos dá conta de que são órgãos do governo municipal, independentes e harmônicos entre si, o Prefeito com funções executivas e a Câmara municipal, com funções legislativas.
Ainda com referência à Lei Orgânica mencionada, dispõe ela que à Câmara compete, privativamente, dentre outras atribuições, a de organizar os seus serviços administrativos. Verifica-se, pois, não poder o Chefe do Executivo intrometer-se nos serviços internos da Câmara (art. 25, inciso III). A ela, tão somente, cabe disciplinar a forma e conteúdo de seus impressos. O mesmo tratamento isonômico deve ser dispensado aos demais órgãos da Administração Pública Municipal.
A pretensão se apresenta como interferência do Legislativo nas atribuições peculiares do Executivo. A propositura não pretende seja a expressão inserida apenas nos envelopes, a título de mensagem, mas em todo e qualquer impresso como ofícios, guias de recolhimento, recibos, certidões, alvarás, contratos, convênios, etc., incluindo todo e qualquer documento oficial que venha a pertencer aos munícipes, a que, de certa forma, agride direito de terceiros.
É ínsita da competência do Chefe do Executivo estabelecer a forma de seus serviços administrativos, dando o conteúdo de seus impressos, observadas as disposições legais.
Lembramos que o Município é proibido permitir ou fazer uso de estabelecimento gráfico, jornal, estação de rádio, televisão, serviço de alto-falante ou qualquer outro meio de comunicação de sua propriedade, para propaganda político-partidária ou fins estranhos à Administração. O serviço religioso não é próprio da Administração, sendo a divulgação da fé ofício das entidades religiosas. Outra conseqüência não trará o projeto de lei senão impor à Administração Municipal, direta e indireta, uma obrigatoriedade de difundir a crença, fins a ela estranhos.
Ademais, se concordância houver, julgamos possam todos os Vereadores pretender (ou até mesmo a população, dada a possibilidade de sua participação direta no processo legislativo) inserir nos impressos municipais qualquer mensagem, lema ou "slogan". E se todos os vereadores tiverem esse intuito?
Afora os aspectos constitucionais, legais e de interesse público, Permitimo-nos abordar o filosófico, apenas para argumentar.
Nossa formação cristã impede acolhimento à propositura. Os princípios religiosos recebidos desde tenra idade nos convencem de que a inserção nos impressos da Administração Pública Municipal da expressão "DEUS SEJA LOUVADO" seria invocar seu Santo Nome em vão.
A rotina de trabalho, a tramitação generalizada de papéis, banalizaria o uso da expressão, não dando ensejo ao respeito que se deve ter todas as vezes que se invocar a Divindade do Criador. Louvar a Deus por obrigação, não é louvá-lo.
SÃO MATHEUS, no sermão da Montanha, quando alude à oração diz:
Não é colocando a expressão “Deus seja louvado” em todos os impressos que se revigorará a fé.
Por analogia ao texto bíblico poderíamos afirmar que não é por muito ler que se estará realmente louvando a Deus.
Se é verdade, como diz o Nobre Vereador, que a quase totalidade da população cultiva a fé em Deus e os valores espirituais e morais dela decorrentes, não teríamos em tamanha proporção os graves problemas sociais e morais da atualidade.
Louvar a Deus, na nossa opinião, significa buscar a reforma interior para fazer a vontade de Deus.
Como bem diz o evangelista:
Religiosidade é uma busca pessoal e não simples exteriorização.
Interrogado acerca do pagamento de tributos Jesus respondeu:
Ao usar rotineiramente o nome de Deus não estaremos dando a "DEUS O QUE É DE DEUS" mas tornando vão o seu Santo nome.
Por tais motivos, com fundamento nas disposições da Constituição Federal e da Lei Orgânica dos Municípios do Estado de São Paulo e ainda pelo próprio respeito e temor à Deus, ausente o interesse público, sou compelido a VETAR TOTALMENTE o projeto de lei em referência.
Expostos, nestes termos, as razões que fundamentam o veto, restituo a matéria ao reexame dessa Nobre Casa de Leis.
Renovo a Vossa Excelência os protestos de estima e consideração.
Este texto não substitui o
original publicado e arquivado na Prefeitura Municipal de Jacareí.